ACESSO À JUSTIÇA E CIDADANIA ON-LINE: ANÁLISE DOS PONTOS DE INCLUSÃO DIGITAL COMO FERRAMENTAS DE INCLUSÃO NO SISTEMA JUDICIÁRIO
Palavras-chave:
Acesso à Justiça. Cidadania Online. Inclusão digital. Democratização digital.Resumo
No contexto contemporâneo, a era digital trouxe uma revolução profunda na forma como as pessoas se conectam, interagem e participam da sociedade. A ascensão da tecnologia e da internet não apenas facilitou o acesso à informação, mas também redefiniu as dinâmicas de participação social e o exercício dos direitos individuais e coletivos. Este fenômeno se estende ao campo jurídico, onde a digitalização tem impactado significativamente a maneira como os cidadãos interagem com as instituições e buscam acesso à justiça.
A cidadania online emerge como uma consequência direta dessa transformação digital. Ela se refere à capacidade dos cidadãos de participar ativamente da vida política, social e jurídica através de plataformas digitais e tecnologias online. Esse conceito vai além do simples uso da internet; engloba a habilidade de utilizar essas ferramentas para exercer direitos, influenciar decisões políticas, e acessar serviços e informações de maneira eficiente e inclusiva.
Essa nova possibilidade de exercer a cidadania on-line gerou um terreno fértil para a ampliação do engajamento cívico e para a democratização do acesso à informação e à justiça. Através de plataformas digitais, os cidadãos podem agora não apenas buscar informações sobre seus direitos, mas também participar ativamente de debates, petições e processos que antes estavam distantes de sua esfera de influência.
Entretanto, apesar das inúmeras vantagens oferecidas pela cidadania on-line, essa realidade não está isenta de desafios. A inclusão digital desigual, por exemplo, é um dos principais obstáculos que limitam o acesso equitativo a essas ferramentas. Nem todos têm a mesma facilidade de acesso à internet ou a dispositivos tecnológicos, criando uma disparidade no exercício pleno da cidadania on-line. Além disso, a complexidade e a burocracia de certos sistemas, especialmente no âmbito jurídico, podem ser um empecilho para a compreensão e utilização efetiva das plataformas disponíveis. Muitas vezes, a linguagem técnica e os procedimentos exigidos tornam-se barreiras para indivíduos com menos familiaridade com esses ambientes digitais.
Portanto, a revolução digital trouxe avanços na interação entre cidadãos e instituições governamentais. No entanto, muitos ainda enfrentam barreiras tecnológicas e burocráticas que precisam ser superadas. Esses obstáculos são cruciais de serem abordados para garantir acesso igualitário aos benefícios da cidadania on-line, especialmente no âmbito jurídico, onde o acesso à justiça é essencial. É fundamental promover iniciativas que visem eliminar essas barreiras e garantir a inclusão digital de todos, em prol de uma sociedade mais justa e equitativa.
A minha trajetória de 25 anos no sistema judiciário proporcionou uma visão privilegiada das transformações pelas quais essa instituição passou ao longo dos anos. Durante essas duas décadas e meia, testemunhei de perto a transição do papel para os sistemas digitais, marcando uma era de mudanças profundas na forma como a justiça é acessada e administrada.
Contudo, ao longo desse percurso, também me deparei com uma realidade que não pode ser ignorada. Muitas pessoas, especialmente aquelas provenientes de comunidades menos favorecidas, enfrentam consideráveis dificuldades em acessar os recursos digitais disponibilizados pelo sistema judiciário. Em muitos casos, essas barreiras são resultado direto da falta de familiaridade com a tecnologia ou da ausência de recursos financeiros para investir em equipamentos e conexão à internet.
Essas observações me levaram a refletir profundamente sobre o papel dos pontos de inclusão digital como ferramentas essenciais para promover a inclusão no sistema judiciário. Afinal, o acesso à justiça não deve ser um privilégio exclusivo daqueles que dominam a tecnologia, mas sim um direito fundamental de todos os cidadãos, independentemente de sua condição socioeconômica.
É com base nesse contexto que surge a motivação para esta dissertação de mestrado. Pretendo realizar uma análise detalhada dos pontos de inclusão digital disponíveis no sistema judiciário, investigando como esses recursos podem ser melhorados e expandidos para atender às necessidades das comunidades mais vulneráveis. Além disso, pretendo examinar os desafios específicos enfrentados por esses grupos no acesso à justiça online e propor estratégias e políticas que possam mitigar essas dificuldades.
Ao abordar essa questão, espero contribuir para a construção de um sistema judiciário mais inclusivo e acessível. O objetivo é garantir que todos os cidadãos, independentemente de sua origem ou condição social, tenham igualdade de oportunidades para fazer valer seus direitos e buscar uma resolução justa para suas demandas legais. Esta pesquisa não apenas reflete minha dedicação ao serviço público, mas também meu compromisso com a promoção da justiça e da cidadania para todos os membros da sociedade.
A justificativa para esta dissertação surge da necessidade de analisar e aprimorar os pontos de inclusão digital no sistema judiciário, visando torná-los mais eficientes e acessíveis para comunidades vulneráveis. Esta pesquisa não apenas se concentra na esfera jurídica, mas também abrange diversas áreas do conhecimento, refletindo sua interdisciplinaridade e impacto abrangente. Assim, este estudo se beneficia da interdisciplinaridade ao integrar conhecimentos de tecnologia da informação, sociologia, direito e educação. Ao abordar os pontos de inclusão digital no sistema judiciário, visa não apenas melhorar a acessibilidade à justiça, mas também promover a igualdade de oportunidades para todos os cidadãos no exercício de seus direitos fundamentais.
Assim sendo, o objetivo desta pesquisa é investigar o papel do Ponto de Inclusão Digital (PID) como ferramentas de inclusão de excluídos digitais no sistema judiciário. Será realizada uma análise sobre como esses pontos contribuem para o acesso à justiça e para a promoção da cidadania online. Nesse contexto, a problemática central que emerge é: Quais são as principais barreiras que impedem ou dificultam o pleno exercício da cidadania online na busca por acesso à justiça? Essa questão visa identificar os obstáculos específicos enfrentados pelos cidadãos no uso das tecnologias digitais para acessar o sistema judicial, enfatizando desafios socioeconômicos, tecnológicos e estruturais que afetam a efetividade da participação digital na esfera jurídica.
Para alcançar este propósito, delinearam-se objetivos específicos que orientaram a investigação: mapear e analisar a normativa internacional e nacional sobre o acesso à justiça; problematizar a cidadania online em um contexto democrático, explorando a participação dos cidadãos em ambientes virtuais; analisar as iniciativas do Poder Judiciário, com ênfase nos Pontos de Inclusão Digital (PIDs), e seu impacto na promoção da acessibilidade e eficiência do sistema judicial brasileiro, considerando como contribuem para superar barreiras tecnológicas, econômicas, geográficas e culturais enfrentados especialmente pelos grupos marginalizados.
Este estudo adota uma abordagem metodológica qualitativa, com uma pesquisa exploratória, utilizando revisão bibliográfica e estudo de caso referente à análise dos PIDs no Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) para acesso à justiça online. A escolha pelo método qualitativo se dá pela natureza investigativa do estudo, que busca compreender profundamente as questões relacionadas à inclusão digital e ao acesso à justiça online.
De acordo com Minayo et al., (2011), a pesquisa qualitativa visa compreender fenômenos sociais em toda sua complexidade, enfatizando a profundidade e a subjetividade das experiências humanas. Ela destaca a importância de entender os significados, motivações, crenças e valores dos participantes, assim como o contexto em que esses fenômenos se desdobram. Denzin e Lincoln (2011) definem a pesquisa qualitativa como um campo de investigação que abrange diversas práticas interpretativas que tornam o mundo visível. Essas práticas transformam o mundo em uma série de representações, incluindo notas de campo, entrevistas, conversas, fotografias, gravações e memos ao próprio pesquisador. Eles enfatizam que a pesquisa qualitativa envolve uma abordagem naturalista e interpretativa do mundo, tentando entender ou interpretar fenômenos em termos dos significados que as pessoas lhes atribuem.
Quanto aos objetivos deste estudo, optou-se pela pesquisa exploratória. Essa abordagem é também definida por Minayo et al., (2011) como um método que busca uma compreensão aprofundada de fenômenos sociais, frequentemente explorando áreas pouco conhecidas ou estudadas. Essa escolha se justifica pela capacidade da pesquisa exploratória em fornecer uma visão inicial e ampla sobre o tema, permitindo a identificação de variáveis relevantes e direcionando a análise de forma mais precisa.
Neste contexto, como procedimento metodológico, adotou-se a pesquisa bibliográfica, que conforme sugerido por Gil (2002), é empregada para realizar um levantamento, seleção e análise crítica de obras já publicadas sobre a temática. Segundo Lakatos e Marconi (2003), a revisão bibliográfica é essencial para identificar o estado da arte do tema pesquisado, proporcionando uma base sólida para a análise dos dados coletados. Ela permite situar o estudo dentro do contexto das pesquisas já realizadas, identificando lacunas e oportunidades de contribuição. Esse método proporciona uma compreensão aprofundada e contextualizada do tema em questão, permitindo explorar contribuições teóricas relevantes relacionadas à inclusão digital, acesso à justiça online e implementação de tecnologias no campo jurídico.
Para isso, foram utilizados autores que abordam o tema, como Cappelletti e Garth, Fontainha, Gomes, Junqueira, Lévy, Mattos, entre outros, cujas obras fornecem uma base teórica robusta e diversificada para a análise dos desafios e das oportunidades no acesso à justiça e na inclusão digital no contexto brasileiro.
Além disso, foi empregado o estudo de caso para analisar os pontos de inclusão digital no TJRO no que diz respeito ao acesso à justiça online. Conforme delineado por Gil (2002), o estudo de caso é uma estratégia de pesquisa que se concentra em uma investigação minuciosa e detalhada de um fenômeno específico em um contexto particular. O estudo de caso foi conduzido por meio da análise documental de dados disponibilizados na internet, além de informações relatadas por Diego Antunes Souza Carvalho, da Coordenadoria dos Fóruns Digitais/SCGJ do TJRO. Essa abordagem permitiu uma investigação detalhada e empírica dos PIDs e seu impacto na promoção da acessibilidade e eficiência do sistema judicial brasileiro.
A escolha da realidade do TJRO como foco de estudo foi motivada pelo fato de que o TJRO representa uma instituição jurídica relevante no contexto brasileiro, desempenhando um papel fundamental na administração da justiça no estado de Rondônia. Vale destacar que o TJRO foi premiado no Prêmio Innovare por seu projeto de Ponto de Inclusão Digital, o que foi o principal motivo por trás da escolha deste tribunal como estudo de caso. Esse reconhecimento reforça a importância e a inovação das iniciativas adotadas pelo TJRO, tornando-o um exemplo significativo para análise e pesquisa.
Assim, a análise específica dos pontos de inclusão digital no TJRO visará identificar as barreiras e desafios enfrentados por diferentes grupos sociais, particularmente aqueles pertencentes a camadas socialmente empobrecidas. Dessa forma, a combinação entre revisão bibliográfica e análise focalizada no contexto específico do tribunal contribuirá para uma compreensão mais abrangente das questões relacionadas à inclusão digital e ao acesso à justiça on-line. Isso destacará desafios e possíveis áreas de aprimoramento no âmbito do TJRO.
Nesse contexto, a pesquisa fundamenta-se teoricamente no trabalho seminal de Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988), que exploraram profundamente as problemáticas relacionadas ao acesso à Justiça. Em relação aos excluídos digitais, são considerados os estudos de Pierre Lévy (2002; 2011) e Fabiana Spengler e Humberto Dalla Bernardina de Pinho (2018), que contribuíram significativamente com suas pesquisas sobre inclusão e exclusão digital.
Além disso, as obras de Deo Campos Dutra e Eduardo Oliveira (2018), Victor Varcelly Farias (2013) e novamente Fabiana Spengler e Humberto Dalla Bernardina de Pinho (2018) são exploradas no contexto da democracia e cidadania online. Adicionalmente, são consideradas as contribuições de Bruna Patricia Ferreira Pinto, Vinicius Pinheiro Marques e David Nadler Prata (2021) no âmbito do processo judicial eletrônico, entre outros autores relevantes.
Assim sendo, para além desta seção introdutória, o estudo é composto por três capítulos distintos. O primeiro aborda a importância do acesso à justiça como princípio fundamental para a proteção dos direitos individuais, examina obstáculos existentes e propõe medidas para promover a igualdade de acesso. O segundo capítulo explora as diversas manifestações de democracia, destaca a interseção entre tecnologia, democracia e acesso à justiça na era digital. Ele enfatiza não apenas as oportunidades oferecidas pela tecnologia, mas também os desafios e questões de equidade associados à transição para serviços de Justiça on-line.
O terceiro capítulo destaca a significativa transformação trazida pela informatização do sistema judicial brasileiro, com especial atenção aos desafios enfrentados pelos excluídos digitais, particularmente dentro do contexto dos PIDs do TJRO. Por fim, o estudo apresentará considerações finais.
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